Embora relatos sobre a origem da colagem na história da arte situem sua gênese no ínicio do século
XX, no cubismo, com
Picasso, Gris e Braque, narrativas feministas reivindicam sua procedência nas tradições populares
das mulheres com as
manipulações de imagens, desde os poemas japoneses no século XII que eram escritos em cima de papéis
colados até as
ilustrações de diários e cartões valentines românticos que se enviavam aos namorados. Infelizmente,
historiadores de arte
ao ordenarem esse ponto inicial da colagem em 1912, excluíram artistas que não faziam parte do
circuito de arte
convencional – mulheres artistas, artistas folks, artistas não ocidentais. O trabalho artístico que
esses outros
realizavam nunca teve status ou reconhecimento, foram considerados inferiores pelos historiadores
que escreveram sobre
arte e cultura.
Miriam Schapiro e Melissa Meyer (1978), criaram o conceito de femmage, ambas se interessavam,
especialmente, em investigar
por que tantas mulheres utilizaram a colagem para produzir arte. Schapiro definiu femmage como uma
palavra para denominar
e incluir as atividades tradicionais de arte feminina e trabalhos manuais artesanais como corte e
costura, photomontagem,
bordado, tapeçaria, patchwork e scrapbook, atividades que no passado eram o que as mulheres com
acesso limitado às “belas
artes” dispunham para criar e fazer arte, mesmo que para fins utilitários. Schapiro e Meyer dizem em
seu manisfesto Waste
not, want not. An inquiry into what woman saved and assembled que as primeiras femmagistas sempre
colecionaram e reciclaram
objetos porque as sobras serviam de material para suas necessidades artisticas, elas reaproveitavam
e remodelavam objetos de
seu cotidiano e davam a eles uma nova voz – suas criações eram compartilhadas apenas com os mais
intímos – familia e amigos.
Schapiro e Meyer (1978), sustentam que cultura artística das mulheres é estruturada com base no que
é a femmage e nos
levam a compreender a colagem dentro da estrutura da vida doméstica das mulheres para além dos
limites da arte moderna.
Como mulheres que vieram dos estudos das artes, as descobertas de Schapiro e Meyer sobre as
primeiras femmagistas foram
fundamentais na construção de uma tática reparadora do fazer arte na esfera feminista como oposição
à hegemonia patriarcal,
por revelarem uma cultura artística que foi silenciada, por criarem um espaço seguro para mulheres
falarem e criarem sem
julgamentos masculinos, por fornecerem uma base para a prática de uma nova arte direcionada a expor
questões sociopolíticas.
Segundo Foucault, (1984, p.28) não existe a constituição do sujeito moral sem modos de subjetivação.
Compreendo que nossos
processos de subjetivação são construídos a partir da vivência com o outro, e que nossos corpos, que
são constantemente
domados e docilizados pelas relações de poder e saber, podem ser usados como ferramenta política de
resistência ao produzir
arte para ressignificar comportamentos e também para questionar dispositivos de controle.
Proponho nessa pesquisa pensar o design por esse viés, como um saber que apesar de ter fundamentos
normativos, se abre para
ser um campo que se expande em transformação. O objetivo é investigar a materialidade de uma prática
artística, que é a
colagem, para refletir sobre feminismo, arte e políticas de visibilidade no campo do design tomado
enquanto partícipe de
determinados processos de subjetivação. A proposta é repensar e sensibilizar pessoas para o
potencial do design como agente
atuante e transformador na produção de comportamentos e discursos.